00:30h - Arranque da Câmara Municipal da Covilhã
02:40h - Paragem para descanso nas Penhas da Saúde
04:15h - Chegada à Torre da Serra da Estrela
05:45h - Arranque para a descida atá à Covilhã
06:20h - Observação do nascer-do-sol
07:00h - Chegada à Covilhã
Total da noite: 51km em 04:25h
Total do projecto: 1636 km desde 22.05.2010
RELATO PESSOAL
A maior aventura alguma vez realizada por mim de bicicleta: a subida nocturna, em autonomia e a solo, à Torre da Serra da Estrela. Apenas eu, a "Poderosa", e a força assustadora do ambiente nocturno da serra mais alta de Portugal Continental.
- A meio da subida
Numa escuridão quase total, apenas irrompida por alguma luz da lua em quarto minguante, avista-se a diferença de escuro entre a linha de horizonte da serra e o céu nocturno e estrelado. Três ambientes completamente diferentes provocam sensações disitintas. Até às Penhas da Saúde, a mata densa abunda com os pinheiros bravos a dominar a paisagem escura. Daí para cima, a vegetação arbórea domina até aos 1600m de altitude. Depois, apenas rocha. Maciços gigantestos e penhascos de granito criam formas fantasmagóricas e paredes quase verticais no horizonte próximo.
- Descanso de 15 minutos nas Penhas da Saúde, aos 1450 metros de altitude e após 13 km percorridos, num dos poucos "pontos de luz" durante o percurso.
A única iluminação que utilizei foi a da bicicleta, alimentada pela electricidade produzida no dínamo montado na roda dianteira, mas que a 6 km/h apenas ilumina o suficente para ver as guias da estrada até 20 metros, e os elementos deflectores de luz da sinalização vertical. O resto, tudo o resto, é uma incógnica. Pouco ou nada vejo, apenas oiço, cheiro e sinto. Suspeito que haverá algo mais para além do que os olhos transmitem ao cérebro. Mas só com a luz do dia me é revelado todo o esplendor da Serra e aquilo que conquistei: 1991 metros de altitude, pedalados com inclinações médias a rondar os 10%. A temperatura na Covilhã rondava os 20ºC quando arranquei. Nas Penhas da Saúde, a 1450m de altitude, já baixara para 15ºC. Na Torre, o meu termómetro registava 10ªC. Frio, muito frio, a pedir um café bem quente.
- No cruzamento para Manteigas
- Lentamente, a altitude ía aumentando, pedalada a pedalada
Uma boa surpresa foram as fontes de água natural que encontrei pelo caminho. Água fresca, e de uma leveza fora do comum, revigoravam-me a cada golo. Atestei a garrafa por duas vezes, ao longo da subida.
- Uma das raras vezes em que preferia ficar na ignorância. 10% de inclinação significa que por cada 100 metros de distância pedalados, sobe-se 10 metros em altitude. A estrada para a Serra da Estrela é uma grande rampa, com quase 25 km de comprimento, desde a zona baixa da Covilhã.
- Tunel escavado na rocha
- A luz da foto engana, pois é resultado do flash da câmara. A minha visibilidade era bem inferior
- Já está quase ....
- A menos de 1000m de distância da Torre
- Já na Torre, após conquistar os 1991 metros de altitude, e dar uma volta a grande velocidade na rotunda da Torre, a primeira superfície plana que apanhei em 25km
Para surpresa minha, não estava tão cansado como seria de esperar. Ainda dei uma volta à rotunda da Torre, a grande velocidade, para celebrar a chegada ao topo. Presumo que estes mais de 1500km que já percorri desde que saí de Lisboa, pelo Litoral Alentejano, Sul do Algarve, Alentejo Interior e Baira Baixa me tenham dado a forma física necessária para realizar esta subida. Isso, o talvez o facto de, por ter pedalado de noite, não conseguir ver o caminho que tinha à frente. Não tinha noção da dimensão das subidas, nem dos maciços que ainda tinha de vencer. Apenas via 20m à minha frente, iluminados pela luz da "Poderosa"
- Com o frio a apertar lá em cima, um cafezinho sabia mesmo bem.
Utilizando um pequeno fogão de campanha alimentado por acendalhas, oferecido pelo Jorge Gambutas, militar do Regimento de Cavalaria 3 de Estremoz, tentei aquecer o café. Infelizmente, o vento era demasiado, e nem mesmo com caixotes a servir de proteção consegui colocar a água a ferver. Fica a tentativa falhada e a vontade de experimentar de novo.
Felizmente, o Carlos Reis e o Joel vieram ter comigo à Torre ... de carro, trazendo uns óptimos (e acabados de fazer) croissants de chocolate do Paúl. Ficámos no carro a aquecer, durante algum tempo, e a saborear os bolos da terra.
- Já com alguma luz, e com o equipamento de descida colocado (óculos e luvas), emprestado pelo Carlos Alves, grande adepto do downhill, preparei-me para a descida. 25 km de pura aceleração e adrenalina estavam para vir.
- Início da descida, já com o sol a querer aparecer no horizonte
- A última foto, no topo de Portugal Continental
- Já na descida, os vales e o skyline da Serra da Estrela
- Lagoa artificial do Covão do Ferro
- A descida foi feita com velocidades médias entre os 50 e os 70 km/h. Excepto nas curvas apertadas, onde reduzia para 30 km/h.
A Serra está cheia de penhascos, que a pique criam recortes assustadores na berma da estrada. Um pequeno erro, uma pequena distracção, uma pequena avaria mecânica, poderiam atirar-me estrada fora. Mas que diabo ... quem não arrisca não petisca. E desta vez coloquei de lado todos os cuidados de segurança com que pedalo na estrada, para viver a 70 km/h e com uma descarga de adrenalina a cada metro que percorria. Foi do outro mundo, a carga energética que me percorreu o corpo durante uma hora de descida, da cota 1991m à cota 600m, na Covilhã. Sem dúvida, uma experiência a repetir no futuro.
- Outra foto, captada em movimento
- O Nascer-do-Sol, já em plena descida
- Nascer-do-Sol na Serra da Estrela
- A meio da descida, com o Sol a oferecer-nos os primeiros raios de luz.
- Já próximo da covilhã, com temperaturas mais amenas, eu e o meu recente amigo Carlos Alves, que me acompanhou na descida vertiginosa, pelas curvas da Serra da Estrela, com o seu automóvel.
- Grande parte do trajecto foi assim. Que gozo !!!
- A natureza na Serra. Joaninha captada por Carlos Alves, durante a descida da serra.
Como última consideração: o meu canivete suiço foi sempre com a lâmina aberta, e colocado em posição de fácil e rápido acesso, por cima de um dos alforges. Com a mão direita conseguia chegar-lhe, mesmo em andamento. Uma precaução que, naturalmente, viria a revelar-se inútil, mas que acabou por ajudar a vencer alguns dos medos naturais que se sentem quando estamos sós, no meio da natureza, praticamente sem luz, como se fossemos cegos. Aqui, os outros sentidos estão em alerta máximo, e ao menor ruído, a adrenalina dispara para valores superiores ao normal.
DADOS TÉCNICOS para cálculo de emissões de CO2
Malas, sacos e alforges: 2, com um total de 12kg
Consumo de líquidos: 2 litros de água, de nascente natural
Outros modos de transporte utilizados: nenhum.
Duches: 1, de aprox.10 minutos
Peças de roupa lavada: 1 calções de ciclismo, 1 par de meias
Horas de utilização de computador: 3:00h
Visualizações do blogue: 400
Novos amigos no Facebook: 15
Carregamento de telemóvel e lanterna: Mala Solar com painéis fotovoltáicos
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS:
MOTOVEDRAS, pelo excelente equipamento que me cedeu.
DIMODA, pelos fatos da Pierre Cardin que me cedeu, para usar nas cidades.
JP SA COUTO, pelo excelente PC Magalhães 2 que ofereceu para esta viagem
OFF7, pelo cálculo e compensação de emissões de CO2.
Bio Future House, pelas malas com painés foto-voltáicos que me carregam o telemóve e a lanterna.
Instituto Geográfico do Exército, pela oferta dos mapas de estradas que me orientam.
Ao Ricardo Santos, pelo tecto por uma noite.
Ao Carlos Alves e ao Joel, por me apoiarem nesta aventura, e acompanharem na descida.
À Carolina, minha mãe, por todos os dias acender uma vela de azeite a Nossa Senhora de Fátima.
Paulo Guerra dos Santos
Parabens por teres alcançado o ponto mais alto de Portugal, na tua poderosa, que agora também poderá chamar ao seu dono de "Poderoso".
ResponderEliminarMuito "fixe" ler o teu blogue, um sonho sem dúvida que pode estar na cabeça de cada um...
Grande abraço e boas energias no pedal.
Luis
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarCaro Luís, acrecentar "Continental" a "o ponto mais alto de Portugal". É que o ponto mais alto de Portugal fica na Serra do Pico, nos Açores.
ResponderEliminarEm todo o caso, os meus agradecimentos por continuares a acompanhar este projecto. Esta experiência foi sem dúvida das mais intensas que vivi até hoje.
Um grande abraço.
Paulo.
olá,
ResponderEliminargostaria de saber porque a subida foi feita de madrugada.
Abraços e boa sorte!
...deslumbrante e sem palavras!!! Venceste mais uma batalha!!! Parabens migo e continua sempre com Nossa Senhora de Fatima a guiar-te!
ResponderEliminarBjssssssssssssss deste Alentejo
Schlickmann, a subida foi nocturna e a descida diurna. Assim, conheci as duas faces da serra. Além disso, uma subida diurna nesta altura do ano, seria extremamente penosa devido ao calor.
ResponderEliminarBolotinha, foi mesmo deslumbrante. As visões nocturnas da serra são ao mesmo tempo aterradoras e apaixonantes. E a adrenalina da descida, bem ... essa não se conta, vive-se!!!
Abraço a todos.
Paulo
Grande aventura, e considero este o post mais espectacular e interessante até à data!
ResponderEliminarRealmente é preciso ter coragem para fazer a subida sozinho durante a noite. Também já andei de noite e sozinho de bicicleta (mas nada que se compare a uma subida à Serra), e realmente por melhor que seja o equipamento de iluminação parece que estamos envoltos numa grande e incógnita massa negra da qual apenas percepcionamos ruídos, variações de temperatura, e alguma teia de aranha ou ramo de árvore a roçar-nos o corpo!
Não duvido que a recompensa da descida tenha valido bem a pena e os riscos corridos durante a subida!
Andava para te perguntar se tinhas alguma preparação física especial para as tuas pedaladas, mas neste post já deste a entender que a única preparação que tens é a resultante das tuas próprias deslocações em bicicleta. É surpreendente e muito motivadora a evolução da nossa forma física resultante do uso regular da bicicleta!
Fantástica, esta experiência de subida da Serra! Obrigado por a partilhares connosco !
ResponderEliminarAbraço,
Francisco
Paulo,
ResponderEliminarBela "conquista", não é verdade? Deve ter sido impressionante. A descida, claro!
Mais duas informações. Numa legenda de foto, enganaste-te ao escreveres Penhas Douradas. Devia ser Penhas da Saúde. É que no texto está correcto.
A lagoa que viste na descida é a lagoa (artificial) do Covão do Ferro.
Grande abraço
JPQueirós
Boas,
ResponderEliminarParabéns Paulo por mais uma conquista.
Foi uma aventura e peras, só mesmo passando por ela se consegue ter essa ideia e tu tiveste essa oportunidade.
Gostei bastante do relato pessoal da aventura.
Continua com força no teu projecto
Grande Abraço
Nelson Gonçalves
Estremoz
Hehehe... Grande maluqueira! Subir de noite tem uma grande vantagem... custa muito menos. É fantástico o que a cabeça (e os olhos) afectam as pernas. Quando se vê as subidas parece que custa muito mais. Assim, vamos tão concentrados no entorno que nem damos fé na estrada. Parabéns e cuidado com as descidas... ainda ontem houve uma tragédia em Braga com um colega nosso por causa dessas descidas que tanto gostamos. Um grande abraço e continuação.
ResponderEliminarP.S Dá os parabéns ao colega que tirou a foto da joaninha - Fantástica!
Francisco, é um prazer partilhar convosco este projecto.
ResponderEliminarJP, obrigado pelas informações. Já actualizei o texto.
Nelson, um grande abraço para Extremoz.
Paulo, o efeito psicológico ao vermos o que nos espera é, em muitos casos, a razão que nos leva a desistir ou a não realizar um projecto. Como por exemplo, usar a bicicleta como meio de transporte. Desistimos, ainda antes de tentar, alegando as mais variadas desculpas.
Abraço a todos e boas pedaladas pelas cidades, campo e serras deste país.
Paulo
Grandes aventuras!
ResponderEliminarContinua em força,pois é um esforço gratificante que ficará para sempre na memória de todos e principalmente na tua.
Simplesmente fabuloso!
ResponderEliminarMeu Deus, que grande aventura!
ResponderEliminarMuitos Parabéns!
A visualização destas magníficas paisagens, as sua vivências e a sensação de dever cumprido valeram com certeza por todo o cansaço e perigo.
Confesso com uma certa inveja, boa é claro, a sorte de ter podido experienciar o nascer do sol no local mais elevado de Portugal Continental.
Portugal continua um país lindíssimo, cheio de gente genuína, tradições magníficas e paisagens maravilhosas. E é com alguma emoção que o digo, por o ver frequentemente a ser menosprezado.
Foi óptimo ter descoberto o seu blogue, e agradeço desde já por promover Portugal e o uso da bicicleta, como um meio de transporte amigo não só do ambiente mas principalmente do Homem.
Nem imagina como soube tão bem poder vivenciar virtualmente este seu dia de viagem.
Continuação de boa viagem até Lisboa!
Um abraço.